1.º Visconde de Abrançalha
JOÃO JOSÉ HENRIQUES TRIGUEIROS DE CASTRO ATAÍDE (1836-1905?), 1.º Visconde de Abrançalha por mercê de D. Luís I (Decreto de 28-VII-1869)[1].
Abrantes, Jazigo da família do Visc. de Abrançalha. Brasão de armas: partido de COUTINHO e ATAÍDE. e |
Nasceu a 4-VII-1836 e
foi baptizado a 17-VIII-1836 em São Miguel da Sé em Castelo Branco, tendo por
padrinhos de baptismo José Maria Moreira de Bergara de Lisboa, que viria a ser
marechal de campo, pelo qual tocou por
procuração o capitão Nicolau Teles Nunes Guedelha de Escalos de Baixo, e
ainda D. Maria Teresa de Castro e Ataíde (mulher de José Maria Moreira de
Bergara), por quem tocou por procuração
Simão Trigueiros do Rego Martel.Faleceu
já viúvo e sem filhos a 1-XII-1905 na Rua Santos e Silva (antiga Rua Grande), na
freguesia de São Vicente em Abrantes, tendo sido sepultado no cemitério público
desta cidade.
Foi fidalgo-cavaleiro
da Casa Real por alvará de D. Maria II (3-II-1849)[2],
e moço-fidalgo com exercício no Paço por alvará de D. Pedro V (9-II-1858)[3].
Era senhor de um valioso e imenso património na região de Abrantes onde tinha várias
casas e propriedades, das quais as principais são a Casa da Rua Grande em Abrantes, e a Casa e Quinta da Abrançalha e a quinta do Casal da Preta que, ao que parece, fariam parte da herança vinda por
via dos Coutinho, assim como a vetusta Casa
e Quinta da Ómnia na freguesia do Rossio ao Sul do Tejo. Em Castelo Branco
era administrador do vínculo dos Regos; e em Lisboa tinha a sua casa principal,
o Palácio de Entremuros (Palácio do Visconde de Abrançalha) situado na Rua
de Artilharia Um – antiga Estrada de
Entremuros –, na qual muito mais tarde veio a ser instalado o colégio das Irmãs Doroteias.
A Câmara Municipal de Abrantes, onde foi presidente (1876-1896 e 1896-1898), e a contígua freguesia de Rio de Moinhos, consagraram-no na toponímia local: ambas atribuíram a uma rua o nome de Visconde de Abrançalha.
Lisboa, Palácio de Entremuros, Rua de Artilharia Um. (Visc. de Abrançalha) |
Lisboa, Palácio de Entremuros (Visc. de Abrançalha) |
Armas da Quinta da Ómnia 1.º - SOUSA, 2.º - CASTRO, 3.º - FREIRE, 4.º - CAMELO. |
Quinta da Ómnia (Visc. de Abrançalha). |
Casou a 27-X-1867, aos 30 anos de idade, no oratório da casa da nubente que ficava na Rua Grande da freguesia de São Vicente de Abrantes, com a jovem sua prima D. MARIA EUGÉNIA ROMO DE CASTRO ATAÍDE (1853-1902), de apenas 14 anos, tendo para este efeito sido “canonicamente dispensados do impedimento de segundo grau consanguíneo”. Foram testemunhas deste casamento o general reformado Luís Herculano Ferreira e o conselheiro Joaquim Rodrigues, ambos residentes em Abrantes.
Visc. de Abrançalha. |
Sua mulher era filha de D. ÁLVARO HENRIQUES ROMO DE SOUSA TAVARES (1815-1856) – irmão da mãe do visconde de Abrançalha – fidalgo da Casa Real nascido a 7-V-1815 na freguesia de São Vicente em Abrantes, e falecido a 3-XII-1856 na freguesia dos Mártires em Lisboa, o qual foi casado a 8-XII-1851 na Igreja de São João, em Abrantes, com D. FRANCISCA DE CASTRO FREIRE JUZARTE DA SILVEIRA (f. 1855), falecida a 1-XII-1855 em Lisboa; ambos sepultados no Cemitério dos Prazeres em jazigo que ostenta um brasão com as armas plenas de TAVARES[5].
Do
casamento dos viscondes de Abrançalha não houve geração, pelo que o seu imenso
património, reunido numa das maiores casas do Ribatejo e Alentejo, por junção
dos bens que foram herdados dos Castro-Ataíde e dos Sousa-Tavares, incluindo
uma casa em Paris, foi legado em grande parte aos seus sobrinhos de Abrantes, assim
como a um filho ilegítimo da viscondessa.
Este matrimónio entre primos, certamente realizado sob a influência da pressão familiar para salvaguardar e aumentar o património de ambas as partes, quando a nubente ainda era uma criança, não teve o sucesso desejado; quer pela ausência de filhos, quer provavelmente pela falta de afecto, o que conduziu este enlace ao fracasso.
Portalegre, Palácio Amarelo. |
Portalegre, Palácio Amarelo. |
Portalegre, Palácio Amarelo. Pedra de armas: TAVARES. |
D. MARIA EUGÉNIA ROMO DE CASTRO ATAÍDE (1853-1902), apesar de amarrada pelo indissolúvel matrimónio religioso, certamente com algum escândalo público para a época devido à relevância social desta família, veio a separar-se do seu marido.
Este acontecimento
trágico, face aos interesses familiares em jogo e às rígidas convenções sociais
da época, foi feito em benefício de uma relação afectiva que terá assumido com
um então jovem aspirante a artista.
É de supor que a ainda muito jovem viscondessa de Abrançalha, à semelhança da alta burguesia e da aristocracia oitocentista, tenha tido uma educação pelas Belas Artes ao cuidado de mestres particulares. Ter-se-á enamorado por um destes seus professores, ao que parece um boémio, divertido e bem humorado, talvez até bastante sedutor, com o qual veio a ter um relacionamento afectivo estável, do qual nasceram dois filhos ilegítimos, após a separação do seu marido.
Este
seu mestre foi JOSÉ AUGUSTO DE FIGUEIREDO, um pintor menor do qual também sabemos
ter sido comerciante (1880) e professor de desenho (em 1903), como se menciona no
assento de baptismo do seu filho RAÚL (1880-1882), e depois no assento de
casamento de seu filho JOSÉ (1878-1944), do qual foi testemunha.
O segundo filho ilegítimo foi RAÚL DE FIGUEIREDO (1880-1882), o qual nasceu a 11-I-1880 e foi baptizado a 11-VIII-1880 na Igreja do Santíssimo Sacramento (ao Chiado), em Lisboa, tendo falecido ainda na primeira infância a 17-VII-1882, veio a receber sepultura no jazigo da viscondessa de Abrançalha no Cemitério dos Prazeres em Lisboa[7].
José Augusto de Figueiredo(Pai dos filhos da viscondessa de Abrançalha)
JOSÉ AUGUSTO DE FIGUEIREDO, “o Pinturinhas”, epiteto tirado das pequenas aguarelas que pintava, privou com destacados homens de letras, artistas e jornalistas do seu tempo, entre os quais se salientou pela sua vida boémia. Era filho ilegítimo de José Adrião de Figueiredo, e de D. Maria Emília Sequeira.
Estudante
da Academia de Belas Artes de Lisboa, discípulo do grande pintor histórico Miguel
Ângelo Lupi (1826-1883), tinha uma “verve que irrompia do seu ar um
tanto taciturno, de criatura ao mesmo tempo irónica e calada”, com “ditos
inesperados e prontos”, dele ficando muitas histórias e pilhérias referidas nas
crónicas da época.
José Augusto de Figueiredo, «Cabeça de Homem» (1878). |
Fonte desconhecida. |
Em Dezembro de 1903, por altura do casamento do seu filho do qual foi testemunha, é dado como “solteiro, professor de desenho”, morador na Rua José Estevão n.º 131, 2.º andar (ao Jardim Constantino).
JOSÉ AUGUSTO DE FIGUEIRED pertencia a uma família
com ligações a vários artistas plásticos de relevo. Era filho de José Adrião de
Figueiredo e de D. Maria Emília; irmão de D. Maria José de Figueiredo (c. 1850)
casada com Justino Guedes Roque Gameiro (c. 1853) – meio-irmão do pintor
ALFREDO ROQUE GAMEIRO (1864-1935) –, do qual teve duas filhas: uma delas D.
Celeste Guedes (n. 1882) casada nas primeiras núpcias de Fernando de Aragão
Morais Bordalo Pinheiro (1889-1966), artista gráfico, director técnico das
oficinas de gravura do "Diário de Notícias" e de "O Século"
(1936), assim como director da Fábrica de Cerâmicas Artísticas das Caldas
(1920-1924; neto de Manuel Maria Bordalo Pinheiro (1815-1880), escultor, pintor
e gravador, o qual foi pai do Columbano Bordalo Pinheiro (1857-1929), notável
pintor naturalista e director do Museu de Arte Contemporânea de Lisboa.
ALFREDO ROQUE GAMEIRO (1864-1935) deixou
uma família de cinco filhos artistas. Entre estes distinguiu-se o reconhecido
escultor modernista RUY ROQUE GAMEIRO (1907-1935) falecido prematuramente aos
29 anos de idade, juntamente com sua mulher D. MARIA HELENA TRIGUEIROS CASTELO BRANCO
(1908-1935), num trágico acidente de mota. Sua mulher era quarta neta de JOÃO
JOSÉ MARTINS PEREIRA DO REGO GOULÃO (n. 1758), de Alcains, Castelo Branco,
fidalgo de cota de armas por carta de 20-III-1821, com um escudo partido em
pala de PEREIRA e de REGO, que foi avô do 1.º visconde de Abrançalha.
Pais e Avós do Visconde de Abrançalha
D. Maria Cristina Romo de Castro Ataíde (n. 1816) (Miniatura em marfim de António Manuel de Santa Bárbara, 1849). |
Armas de João José Martins Pereira do Rego Goulão (n. 1758). 1.º - PEREIRA, 2.º REGO. |
Alcains, Solar dos Goulões |
O visconde de Abrançalha, tal como sua mulher e prima, era neto materno de D. MANUEL HENRIQUES ROMO DE SOUSA TAVARES (n. 1762), nascido a 22-IX-1762 na freguesia da Sé em Portalegre, fidalgo da Casa Real, coronel do Regimento de Milícias de Portalegre (1821), onde foi grande proprietário, e de sua segunda mulher com a qual casou a 9-V-1803 na freguesia de São Vicente em Abrantes com D. MARIA TERESA DE CASTRO E ATAÍDE DE SOUSA TAVARES (n. 1787)[14], nascida a 1-I-1787 em Abrantes, da qual teve sete filhos.
♦
D. MARIA JOÃO REMUS TRIGUEIROS MARTEL (n. 1942).
2.º Viscondessa de Abrançalha
[1] ANTT, Registo Geral de Mercês, D. Luís I,
l. 21, fl. 67v.
[2] ANTT, Registo Geral de Mercês, D. Maria II, liv.2, fl.19v-20.
[3] ANTT, Registo Geralde Mercês, D. Pedro V, liv.12, fl.48.
[4] VALDEZ, Rui Dique Travassos, Subsídios para
a Heráldica Tumular Moderna Olisiponense (2.ª edição. Porto: Livraria Esquina,
1994), p. 148.
[5] D. Álvaro
Henriques Romo de Sousa Tavares (f. 1855), e sua mulher D. Francisca de Castro
Freire Juzarte da Silveira (f. 1856), estão sepultados no jazigo n.º 1057 - rua
15, com a inscrição «DE SOUSA TAVARES». No mesmo jazigo está sepultada D. Ana
Emília Trigueiros Martel Goulão (1792-1874), falecida a 31-I-1874, irmã de
Joaquim Trigueiros Martel (1801-1873), 1.º Conde de Castelo Branco.
[6] Segundo
relata a imprensa lisboeta da época.
[7] VALDEZ,
Rui Dique Travassos, Op. Cit.
[8] O Grupo do Leão (1881-1889)
foi uma tertúlia boémia de mais de 20 artistas portugueses – dissidentes da
Sociedade Promotora de Belas Artes (1862-1901) – que se reunia na Cervejaria Leão de Ouro (situada na Rua do Príncipe, actual Rua 1º de Dezembro) em
Lisboa, o qual foi responsável pela divulgação e pelo sucesso da pintura do
Naturalismo em Portugal. A Promotora pugnava
pelo Romantismo.
[9] A «Cabeça de Homem» (1878), representa um indivíduo de
traje humilde, com um rosto sereno e melancólico, emoldurado por uma barba
hirsuta, e inclinando-se ligeiramente para baixo.
[10] Sobre José
de Figueiredo, o Pinturinhas, veja:
OLISSIPO, Revista dos Amigos de Lisboa, Ano V, Janeiro de 1942, pp. 32 e 33;
ARQUIVO DA UNIVERSIDADE DE LISBOA, Vol. IV, Lisboa, Universidade de Lisboa,
1917, pp. 190-191; e PAMPLONA, Fernando, Dicionário de pintores e escultores, Vol. II, (Porto, Civilização Editora, 1987), p. 309.
[11] ANTT, Registo Geral de Mercês, D. Maria II,
Liv. 2, fl 132v.
[12] ANTT, Feitos Findos, Justificações de
Nobreza, mç. 14, n.º 40 (autos); ANTT, Cartório da Nobreza, Livro I, fl.
63 v. – As armas dos PEREIRAS são: em campo vermelho, com uma cruz florenciada
e vazia. Timbre: uma cruz de vermelho, florenciada e vazia, ladeada de asas de
ouro estendidas.
As armas dos REGOS, são: em campo verde, com uma banda ondada
e aguada de sua cor, carregada de três vieiras de ouro. Timbre: uma vieira do
escudo, entre duas plumas de verde, picadas de ouro.
[13] O Solar dos Goulões, actualmente
classificado como imóvel de interesse público e uma das habitações temporárias dos
primeiros Condes de Castelo Branco, tem anexa uma capela fundada na primeira
metade do século XVIII, que já foi conhecida por diversos nomes, a saber Capela
de Nossa Senhora da Piedade, do Senhor das Chagas (devido a uma imagem
religiosa que sangrou milagrosamente por diversas vezes em 1722), e actualmente
como Capela de São Brás. Deve-se a sua construção à iniciativa, expressa em
testamento por D. Manuel Sanches Goulão (1677-1719), 6.º bispo de Meliapor em
1717, que faleceu num naufrágio junto ás ilhas de Angoxa, deixando várias
fazendas vinculadas para sustento da citada capela e de um Hospital anexo que
ainda funcionou por alguns anos. Nesta capela foram baptizadas, casaram, e
estão sepultadas, sucessivas gerações de Goulões nascidas a partir de 1733.
Encimando a porta principal podemos ainda ver esculpida uma mitra alusiva ao
bispo que a fundou D. Manuel Sanches Goulão, filho de primeiro matrimónio de
José Martins Goulão (1647-1716), sargento-mor das Ordenanças de Castelo Branco,
com D. Maria Gonçalves (f. 1679).
[14] D. Manuel Henriques Romo de Sousa Tavares (n. 1762) casou em primeiras núpcias a 30-X-1776, em Portalegre, com D. Ana Teresa de Valadares Galeano Pais (n. 1776), da qual teve geração.
Muito interessante. Não sabia que JOÃO JOSÉ HENRIQUES TRIGUEIROS DE
ResponderEliminarCASTRO ATAÍDE era albicastrense, meu conterâneo. Parabéns por este texzto.Abraço, João.